Happy new year! For several reasons, 2023 has been a slow year for this website, but I’m excited to have more time to devote to it in 2024. Even though I have not written anything new for a while, I have occasionally found time to upload some older texts, so feel free to take a look around and sign up for email updates if you’d like to receive a notification when something gets (re)posted. I will be working on translations more regularly this year, so the archive should continue to grow. But I also want to return to the present here, and use this space for occasional recommendations and brief reflections on what I’ve been seeing in a timely manner.
Or just barely: today is actually the last day to stream for free a new work by the Recife-based artist Jonathas de Andrade at MoMA’s website. The 25-minute-long video is called Olho da Rua (Out Loud), and was completed in 2022, before the latest presidential election in Brazil. MoMA’s website includes an interview with the artist, in which he provides the proverbial wall text for how the piece came to be. The video documents a series of activities inspired by Augusto Boal’s Teatro do Oprimido (Theater of the Oppressed), which employed scenic exercises that invited the oppressed to take hold of the theater as a means of expression. Out Loud opens with a direct reference to Boal’s ideas, reproducing and translating the keywords in his “Árvore do Teatro do Oprimido”—the Tree of the Theater of the Oppressed—which laid out its rationale and practice.
Out Loud nods to traditional theater in its structure, which comprises eight acts, which are announced, number and named in superimposed title cards. However, instead of dramatic acts, these segments retrieve the performative connotation of the word, inviting about 100 people in marginalized situations to act in the middle of a public square. The exercises establish two primary sensory mediators. Some of them directly address the gaze (the original title is an expression that literally translates as “eye of the street” or “from the vantage point of the street”—or viewpoint, in theatrical language—but that also means “out there”), twisting conventions of the pictorial arts (portraiture; reflections; still life compositions—which, in one of the segments, become “full life;” or “natureza farta”—plentiful nature, instead of “dead nature,” as in the Portuguese expression for still life). But there is another sensory organ at work in the film, that has a specific connotation in Brazilian art: the mouth.
Through the mouth, Jonathas de Andrade recovers Oswald de Andrade’s concept of “anthropophagy”—cannibalism—as the source of destructive originality in Brazilian art. The combination of Oswald’s concept with the performance of the oppressed creates a peculiar disjunction that destabilizes the predicaments of the museum space—a gesture perhaps best expressed in Act 5, “Boca Cheia” (mouthful), which is a collection of close ups of mouths chewing food. The work is filled with manifestations of the carnivalesque, in which excess (of pleasure) stands as a form of defiance to the precariousness that is daily forced on those bodies and lives.
But, for Oswald, anthropophagy was also an artistic attitude—the gesture of chewing and digesting foreign influences, and transforming their meaning in the process. In its original context, the expression inspired a combination of the Brazilian popular vernacular with the experiments of the international avant-garde. In Jonathas de Andrade’s video work, this tension is often enacted in the relationship between the museum space and cinema.
Several of his moving image works allude directly or indirectly to genres, authors, procedures, and even specific works in cinema. His 2016 16mm film O Peixe (The Fish)—which was on view at the New Museum in 2017—appropriates the conventions and desires of ethnographic cinema; the 2018 video Voyerístico (Voyeuristic) drove me to think of Robert Bresson’s L’Argent (1983); O Caseiro (Housekeeper, 2016) was a direct recreation of Joaquim Pedro de Andrade’s O Mestre de Apipucos (The Master of Apipucos, 1958).
Perhaps in a more indirect way, Out Loud echoes one of the most famous scenes in Brazilian cinema: the theater of politics in Glauber Rocha’s Terra em Transe (Entranced Earth, 1967). By repurposing the techniques of the Theater of the Oppressed, Jonathas de Andrade creates a carnivalesque pastiche of Glauber’s brilliant scene, which was already a carnivalesque pastiche of the country’s socio-political reality. As Ismail Xavier has extensively written about, Glauber’s mise en scène create a theatrical stage in a preexisting space (in this case, Rio de Janeiro’s Parque Lage), which reframe the theater as a form of reality, and reality as a form of theater. Made for the museum, Out Loud reclaims Brazilian cinema as an endless hall of mirrors in which the distorted reflection of reality and the reflection on distorted reality feedback until origin and destination, but also the original and the copy, resonate toward infinity.
* * *
Jonathas de Andrade streaming @MoMA
Feliz ano novo! Por diversos motivos, 2023 foi um ano morno aqui no site, mas me anima a possibilidade de dedicar mais tempo a ele em 2024. Embora eu não tenha escrito nada novo por aqui nos últimos meses, ocasionalmente tenho republicado alguns textos mais antigos, portanto fica o convite para darem uma olhada e se inscreverem para receberem atualizações futuras (do presente ou do passado) por e-mail. Este ano, dedicarei um pouco mais de tempo às traduções de textos do meu arquivo de publicações, no work-in-progress permanente de reuni-los por aqui. Mas também quero voltar ao presente, e usar este espaço para recomendações ocasionais e breves reflexões sobre o que tem me movido a pensar e escrever.
Para não quebrar as tradições com excessivo otimismo, já começo com atraso: hoje é o último dia para assistir gratuitamente a um novo trabalho do artista pernambucano Jonathas de Andrade no site do MoMA. O vídeo de 25 minutos chama-se Olho da Rua e foi concluído em 2022, antes da última eleição presidencial no Brasil. O site do MoMA inclui uma entrevista com o artista, que fornece o proverbial wall text sobre como a peça foi criada. O vídeo documenta uma série de atividades inspiradas no Teatro do Oprimido, de Augusto Boal, que empregava exercícios cênicos que convidavam os oprimidos a se apropriarem do teatro como meio de expressão. Olho da Rua começa com uma referência direta às ideias de Boal, reproduzindo e traduzindo as palavras-chave de sua “Árvore do Teatro do Oprimido”, sintetizando sua lógica e prática.
Olho da Rua remete ao teatro tradicional em sua estrutura, compreendendo oito atos anunciados, numerados e nomeados em cartelas sobrepostas. No entanto, em vez de atos dramáticos, esses segmentos recuperam a conotação performática da palavra, convidando cerca de 100 pessoas em situações marginalizadas a atuar—ou melhor: agir—no meio de uma praça pública. Os exercícios estabelecem dois mediadores sensoriais primários. Alguns endereçam o olhar, distorcendo convenções das artes pictóricas (retrato; reflexo; natureza morta – que, em um dos segmentos, se torna “natureza farta”). Essa distorçam já se dá na própria polissemia do título: o olho da rua é também um ponto de vista—ou viewpoint, no léxico do teatro. Mas há outro órgão sensorial em ação de conotação específica na arte brasileira: a boca.
Pela boca, Jonathas de Andrade recupera o conceito de Oswald de Andrade de “antropofagia” como fonte da originalidade destrutiva na arte brasileira. A combinação do conceito de Oswald com a performance do oprimido cria uma disjunção peculiar que desestabiliza o espaço do museu – um gesto que talvez seja melhor expresso no Ato 5, “Boca Cheia”, coleção de closes de bocas comida. O carnavalesco é princípio estruturante, recolocando o excesso (de prazer) como desafio à precariedade imposta diariamente a esses corpos e vidas.
Vários de seus trabalhos com imagens em movimento fazem alusão direta ou indireta a gêneros, autores, procedimentos e até mesmo obras do cinema. Seu filme em 16 mm O Peixe (2016) se apropria das convenções e desejos do cinema etnográfico; o vídeo Voyerístico (2018) me fez pensar em L’Argent (1983), de Robert Bresson; O Caseiro (2016) era uma recriação direta de O Mestre de Apipucos (1958), de Joaquim Pedro de Andrade.
Talvez de uma forma mais indireta, Olho da Rua ecoa uma das cenas mais famosas do cinema brasileiro: o teatro da política em Terra em Transe (1967), de Glauber Rocha. Ao reaplicar as técnicas do Teatro do Oprimido, Jonathas de Andrade cria a um pastiche carnavalesco da brilhante cena do filme de Glauber, que já era um pastiche carnavalesco da realidade sociopolítica do país. Como Ismail Xavier escreveu extensivamente, a mise en scène de Glauber cria um palco teatral em um espaço qualquer (nesse caso, o Parque Lage, no Rio de Janeiro), que reformula o teatro como uma forma de realidade, e a realidade como uma forma de teatro. Feito para o museu, Olho da Rua recoloca o cinema brasileiro como sala de espelhos sem fim, na qual o reflexo distorcido da realidade e o reflexo da realidade distorcida se retroalimentam, fazendo com que origem e destino, original e cópia, ecoem feito abismo.