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The Adventures of Paulo Bruscky (As Aventuras de Paulo Bruscky, 2010), Gabriel Mascaro

VERSÃO EM PORTUGUÊS

Originally published at Cinética in May 2012.

The latest early cinema

As Aventuras de Paulo Bruscky (The Adventures of Paulo Bruscky), directed by Gabriel Mascaro, is a film about the history of filmmaking:

– A behind-the-scenes film: a film about making a film, although very different from Francois Truffaut’s Day for Night (1973). “It’s like cinema within cinema,” says Paulo Bruscky. Perhaps The Adventures of Paulo Bruscky is the only truly possible film about filmmaking – for the simple reason that neither the film nor its making actually exist. They are equal in their nonexistence;

– The inevitable teleology of a projection that runs from beginning to end: the film is born from the pre-world, the creation of a character, and heads toward the post-world, releasing the character into the stratosphere. All cinema is linear;

– A documentary character: Paulo Bruscky, the protagonist, is not Paulo Bruscky, the artist, an actual person – a duality that is emphasized by the virtual doppelganger created in Second Life. Like that inhabited world, the character Paulo Bruscky is born with the beginning of the film, and ends with its end, even though it also exists outside of it. Once the film is made, Paulo Bruscky, the protagonist, ceases to be part of the film and becomes part of the world – thus, part of everything outside the film – fulfilling the “dematerialization and rematerialization” of the subject by the documentary;

– A Lumière film: at one point, Paulo Bruscky talks about a pre-Lumière project that he once conceived to make a film without a camera, without film, with images attached to the rail tracks of the train, seen in motion by the speed of the train itself. The Adventures of Paulo Bruscky is the metaphorical and distorted version of this film. Like Lumière, Mascaro needs to “invent” a new medium to record a new experience of the world, and his film finds life in the same interstitial space between recording – the diegetic and non-diegetic world of today – and invention. Or is it the invention of the medium that determines this new experience of the world? “In fact, I make videos for people who want to have a record of this life here…” the phrase, said by Gabriel Mascaro’s own doppeleganger in the film, reaffirms the proximity to Lumière. And since the world in question is malleable, there are no limits to the camera: it films underwater interviews, goes through walls, flies, dies, resurrects. There is no image that cannot be made, “there are no more unfeasible projects;”

– “The last impressionist painter”: the nickname given to Lumière by Jean-Luc Godard – and recalled by Jacques Aumont in L’oeil Interminable – nods to the impressionist desire fulfilled by the filmmaker to capture the movement of the world, the multiplicity of leaves on a tree, the variations of light. Cinema was the last nail in the coffin of impressionism, and the Second Life film is the latest perversion of this idea. In The Adventures of Paulo Bruscky, Gabriel Mascaro works like an impressionist of the impressionistic simulacrum;

– A travelogue: in an era of ubiquitous television journalism, is Gabriel Mascaro in The Adventures of Paulo Bruscky the last director to preserve the tradition of early travelogues? “The survival of cinema today lies in its ability to play off a general feeling of saturation with regard to images. This play consists of delaying as much as possible (a few seconds) the seizing of the seen by the already-seen; therefore, showing what has not been shown before – at least on the screen” (Serge Daney);

– A documentary that forges reality: in an era of simulacra, it is necessary to forge a clearly artificial reality in order to achieve an impression “more real than the real.” As in the anachronisms of Robert Flaherty (the ancient seal hunt that was no longer practiced at the time of filming; the shark hunt where there are no more sharks), invention meets reconstitution in order to account for the world. It is the lie that comes closest to the truth. “Historians don’t always tell the truth, so it is art that leaves a better, more real record of history;”

– A studio documentary: making a film in Second Life takes advantage of the possibility of shaping a world and documenting it in its entirety. It is perhaps the closest one can get to a documentary made in the style of a studio film;

– Insolence without mockery: The Adventures of Paulo Bruscky is a film that is as self-reflexive as it is self-ironic: every serious investigation seems to lead back to material physicality – of sex, of dancing, of unrestricted movement, of the inegotiable limits of body and matter in a reality that is not corporeal nor material. “I like to look at useless things that serve no purpose,” says the protagonist. Like in the films of Hong Sang-soo, the conceptual and reflective framework leads to the realization that human gestures are great bubbles of banality, determined by far more concrete and self-satisfying impulses and desires than such seriousness may foresee. The Adventures of Paulo Bruscky fulfills the ultimate goal of the concept by reaching the banal.


* * *


Publicado originalmente na Cinética em Maio de 2012.

O último primeiro cinema

As Aventuras de Paulo Bruscky, de Gabriel Mascaro, é um filme sobre a (história da) realização cinematográfica:

– Um filme de making of: um filme sobre se fazer um filme, embora muito distante de um Noite Americana (1973), de François Truffaut. “É como se fosse o cinema dentro do cinema”, diz Paulo Bruscky. Talvez As Aventuras de Paulo Bruscky seja o único filme de making of realmente possível – pelo simples motivo de que nem o filme nem o making of, de fato, existem. Eles se igualam em sua inexistência;

– A inevitável teleologia de uma projeção que corre do início ao fim: o filme nasce do pré-mundo, da criação de uma personagem, e vai até o pós-mundo, soltando a personagem na estratosfera. Todo cinema é linear;

– A personagem no documentário: Paulo Bruscky, o protagonista, não é Paulo Bruscky, o artista, pessoa física – duplicidade que é ressaltada pelo doppelganger polivalente virtual do Second Life. Assim como o mundo habitado, a personagem Paulo Bruscky nasce com o começo do filme, e termina com seu final, mesmo existindo fora dele. Uma vez feito o filme, Paulo Bruscky, o protagonista, deixa de ser parte do filme e se torna parte do mundo – logo, parte de tudo que está fora do filme – cumprindo a “desmaterialização e a rematerialização” do sujeito pelo documentário;

– Um filme de Lumière: em dado momento, Paulo Bruscky fala de um projeto pré-lumièriano de fazer um filme sem câmera, sem filme, com imagens presas aos batentes do trilho do trem, vistas em movimento pela velocidade do próprio trem. As Aventuras de Paulo Bruscky é a realização metafórica e deformada deste filme. Como Lumière, Mascaro precisa “inventar” um novo meio para registrar uma nova experiência de mundo, e seu filme sobrevive no mesmo limite entre o registro – do mundo diegético e do não-diegético, hoje – e a invenção. Ou será a invenção do meio que determina esta nova experiência de mundo? “Na verdade, eu faço vídeos para as pessoas que querem ter um registro desta vida aqui”: a frase, dita pelo duplo de Gabriel Mascaro dentro do filme, reafirma a aproximação com Lumière. E como o mundo em questão é moldável, não há limites para a câmera: ela filma entrevistas sub-aquáticas, atravessa paredes, voa, morre, ressuscita. Não há imagem que não possa ser feita, “não existem mais projetos inviáveis”; ;

– “O último pintor impressionista”: a alcunha dada a Lumière por Jean-Luc Godard – e trabalhada por Jacques Aumont em “O Olho Interminável” – partia do desejo impressionista cumprido pelo cineasta de captar o movimento do mundo, a multiplicidade das folhas, as variações de luz. O cinema era a última tábua no caixão do impressionismo, e o filme em Second Life é a última perversão desta idéia. Em As Aventuras de Paulo Bruscky, Gabriel Mascaro trabalha como um impressionista do simulacro impressionista;

– Um filme de viagem: em era de telejornalismo onipresente, será o Gabriel Mascaro de As Aventuras de Paulo Bruscky o último diretor a manter a tradição dos primeiros filmes de viagem? “A sobrevivência do cinema está hoje na capacidade do jogo que ele pode criar no interior de um sentimento geral de saturação em relação às imagens. Jogo que consiste em atrasar pelo maior tempo possível (alguns segundos) a tomada de poder do visto pelo já-visto; portanto, mostrar o que não foi mostrado antes – ao menos na tela” (Serge Daney);

– O documentário que falseia a realidade: em época de simulacros, é necessário forjar uma realidade claramente artificial para se chegar a uma impressão “mais real que o real”. Como nos anacronismos de Flaherty (a primitiva caça às focas que já não era mais praticada na época da filmagem; a pesca de tubarão onde não existem mais tubarões), a invenção se encontra à reconstituição para melhor dar conta do mundo. É a mentira que mais se aproxima da verdade. “Os historiadores nem sempre falam a verdade, então é a arte que deixa um registro da História mais bem feito, mais real”;

– Um documentário de estúdio: realizar um filme em Second Life é aproveitar a ampla possibilidade de se moldar um mundo e documentá-lo em sua inteireza. É talvez o mais próximo que se possa chegar de um documentário feito aos moldes do cinema de estúdio;

– Insolência sem esvaziamento: As Aventuras de Paulo Bruscky é um filme tão auto-reflexivo quanto auto-irônico: a reflexão profunda devolve sempre à brutalidade da matéria – o sexo, a dança, a movimentação irrestrita, os limites intransponíveis do corpo e da matéria em uma realidade que não é corpórea ou material. “Eu gosto de olhar para as coisas inúteis que não servem para nada”, diz o protagonista. Como em Hong Sang-soo, todo o arcabouço conceitual e reflexivo leva à constatação de que os gestos humanos são grandes bolhas de banalidade, determinados por ensejos e desejos bem mais concretos e auto-suficientes. As Aventuras de Paulo Bruscky realiza o sonho do conceito de alcançar a banalidade.

2 thoughts on “The Adventures of Paulo Bruscky (As Aventuras de Paulo Bruscky, 2010), Gabriel Mascaro”

  1. Pingback: Gabriel Mascaro: Ebbs and Flows - FABIO ANDRADE

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